O 10º A de 2019 durante viagem de agrimensura
Por Mauro Pompeu Porrino, professor de Matemática do ensino médio
Ao final da Idade da Pedra, impelidos pelas mudanças climáticas que provocavam a desertificação, homens e animais encontraram a vida junto a quatro grandes cisternas: o vale do rio Nilo, junto ao Saara; o vale dos rios Tigre e Eufrates, junto ao deserto da Arábia; o vale do rio Indo, junto ao deserto de Thar, na Índia; e o vale do rio Amarelo, junto ao deserto de Gobi, na China. A partir desse momento, a humanidade nunca mais foi a mesma.
A grande densidade populacional alavancou uma espécie de revolução agrícola – os homens não poderiam mais sobreviver como caçadores e coletores nômades. A necessidade de construir barragens e valas de irrigação, de medir os terrenos alagados periodicamente pelas enchentes desses grandes rios e de ter um calendário para nortear a semeadura e a colheita gerou mapas e tabelas de registros do que se passava na terra e nos céus. Nasceu a escrita. O homem aprendeu a forjar o bronze, surgiram os artesãos especializados e o arado de metal.
No 10º ano Waldorf, voltamos a esse fervilhante período cultural da Era de Touro, já abordado no 5º ano. Período de engenho, de construir as primeiras cidades, de observar e descrever o mundo, de assentar as bases na Terra, de se perceber dentro de um Cosmos, de se preocupar com a alimentação e a saúde das gentes, de registrar as grandes sagas em pequenas tábuas de argila e em pergaminhos…
Ao lado da história da literatura universal, da geografia das grandes transformações físicas e climáticas, da física das questões relativas ao tempo e ao espaço, da História Antiga, da culinária, dos primeiros socorros e de outros tantos conteúdos desse ano riquíssimo, os alunos tomam contato com a agrimensura, atividade arquétipo da Geometria, relacionada à medição de terras.
Nessa época, partindo de discussões sobre a forma da Terra e o efeito de sua curvatura nas medições, trazemos os alunos para cada vez mais perto, até o chamado campo topográfico, área em que a geometria euclideana impera. Ao final do trabalho, cada terreno estará descrito minuciosamente e sua posição na Terra, bem demarcada. O aluno, bem “aterrado”, poderá então dizer: Eu estou aqui.
Numa viagem de uma semana a Botucatu (SP), em áreas da Fazenda Demétria, berço da agricultura biodinâmica no Brasil, cada grupo de seis alunos fica responsável pelo levantamento topográfico completo de uma área de mais ou menos 1 hectare ( 10 000 m² ). É uma atividade de caráter eminentemente solar. Todas as horas diurnas são passadas no trabalho de campo, com 360° de horizonte, sob o sol que nos protege, uma vivência há muito abandonada na vida urbana do século XXI.
As atividades desenvolvem autonomia, companheirismo, garra, habilidades técnicas no manuseio de equipamentos de precisão, observação, concentração, organização. Criam também uma nova relação do aluno com a Matemática. Centenas de números anotados em planilhas passam a significar algo muito concreto quando surge a reprodução primorosa do terreno numa planta topográfica com nível de precisão profissional.
A planta individual e o relatório completo do projeto são o fruto de experiências memoráveis, uma verdadeira obra de arte em que não se abarca, ao olhar, tudo o que o artista viveu para chegar lá. Esse material precioso é apresentado em nossa visita anual à Escola Politécnica da USP, onde os alunos conhecem os mais modernos equipamentos, como medidores eletrônicos de distância, aparelhos Estação Total, G.P.S. ( Global Positioning System) etc. Lá também conversam com os professores de Informações Espaciais, disciplina-gêmea da nossa, oferecida no 2° ano do curso de Engenharia Civil.