A transformação pela arte
Publicado em: 27/04/2018
A Vielada Cultural do Jardim Boa Vista chega à sua 12º edição homenageando Raquel Trindade
Por Katia Geiling
Trazer arte e cultura para as vielas do Jardim Boa Vista. Oferecer às crianças e jovens do bairro a oportunidade de conversar (e de se encantar) com poetas, músicos, fotógrafos, grafiteiros, dançarinos e artistas das mais variadas linguagens que produzem obras de qualidade — e que quase nunca chegam às periferias.
Essa é a proposta do Coletivo Vie La En Close, criado em 2010 na favela do Morumbizinho, comunidade vizinha do Colégio Micael. O principal projeto do grupo é a Vielada Cultural, que no próximo sábado chega à sua 12a edição homenageando Raquel Trindade, uma das grandes artistas da cultura popular brasileira, que faleceu aos 81 anos no último dia 15 (veja programação completa abaixo). A sede do coletivo funciona desde 2015 num espaço cedido pelo Micael, no local onde antes ficava a Creche Nova Esperança.
O poeta Giovani Baffô, cofundador do Vie La En Close, nascido e criado no Morumbizinho, conta que desde pequeno se sentia diferente das outras crianças: gostava de literatura e de músicas que não tocavam nas FMs. Ele acredita que a convivência com uma professora da EMEF Solano Trindade que era mãe de um aluno do Micael tenha contribuído para o despertar de seu interesse pela arte. “A Bernardete ia em casa e me ensinava jogos, me ensinava a fazer tricô, a pintar. Fui acompanhado por ela dos 7 aos 10 anos. Eu não sabia porque era diferente da molecada, mas depois liguei os pontos: era por causa da Bernardete. Fui crescendo com essa onda de arte”, lembra.
Naquela época, a professora Bernardete Sulzbach fazia parte do grupo de pais, educadores e amigos do Colégio Micael que fomentou a criação da ACOMI (Associação Comunitária Micael), organização apoiada pela escola que realiza no bairro um trabalho socioeducativo fundamentado na pedagogia Waldorf.
Sempre que podia, Giovani saía do Jardim Boa Vista para saciar sua sede por cultura. Vivia em bibliotecas e acompanhava a programação de shows gratuitos da cidade. Adorava assistir às peças encenadas no Colégio Micael. “Vi muitas. Foram a base de teatro que eu tenho hoje.” Com o tempo, começou a pensar em formas de trazer arte para o lugar onde nasceu. Em 2000, criou o Invasão Cultural no Boa Vista. As ações foram ganhando corpo e parceiros, muitos deles do próprio bairro.
Em 2016, seis anos após sua fundação, o coletivo Vie La en Close foi um dos 30 contemplados pela 1º Edição do Programa de Fomento à Cultura da Periferia da Cidade de São Paulo. A Vielada Cultural hoje é um marco cultural em São Paulo, atraindo pessoas de outras regiões da cidade e até de outros estados. “O Micael devia participar disso. A gente gostaria de ter um palco do Micafest no meio da comunidade! A Vielada pode ser um passo para a molecada do colégio se misturar lá”, sugere Giovani.
Ao longo do ano, o coletivo também oferece oficinas de diversas linguagens artísticas para os moradores do Boa Vista. “Com elas, as crianças podem se experimentar nas artes, não apenas apreciar”, ressalta a educadora Ana Carolina Laet, integrante do Vie La en Close.
“Depois desses anos todos de trabalho do coletivo, hoje a gente vê na comunidade criança que quer tocar um instrumento, que tem essa gana de ser músico”, conta Tiago Ferraz, integrante do Vie La en Close e ex-funcionário do Micael. Assim como Giovani, Tiago nasceu no Morumbizinho e frequentou as atividades da ACOMI quando criança. “Sou muito grato a tudo o que recebi ali. Hoje sou voluntário e dou aulas de dança de salão na ACOMI”, finaliza.
Tiago, Ana Carolina, Mariana e Giovani, integrantes do Vie La En Close, em visita ao Colégio Micael